Arquitetura e Cinema: a arte das montagens na composição cénica

A arquitetura é uma forma de arte que transcende o seu criador e se torna parte do coletivo, permitindo diferentes interpretações e utilizações. Após a conclusão de uma obra arquitetónica, ela deixa de pertencer exclusivamente ao arquiteto e torna-se democrática para a sociedade, através dessa democratização a arquitetura encontra a sua interseção com outras disciplinas de criação, influenciando e sendo influenciada por diversas formas de expressão.

O ponto que queremos destacar dessa simbiose é o uso de montagens para compor cenários, permitindo que os cineastas misturem habilmente arquitetura e narrativa em fascinantes experiências cinematográficas.

Com o recurso a montagem cria-se uma sequência de cenas curtas e interconectadas que geralmente são acompanhadas por música e usadas para comprimir o tempo, transmitir informações rapidamente e evocar respostas emocionais. Uma criação e reinterpretação de espaços de edifícios existentes alterando programas, ambientes e até mesmo a sua localização. O mesmo edifício pode ser apresentado de diferentes formas em diferentes filmes, seja como um espaço habitacional, um edifício de escritórios, ou um outro programa, compondo cenários através de montagens e transições espaciais, essas transições podem estar ou não geograficamente ou tematicamente relacionadas, mas como resultado ficamos com uma sensação de coerência e imersão, uma ilusão cinematográfica que desafia a realidade.

 

A própria arquitetura conta uma história através do seu desenho, história e propósito, ela molda o comportamento humano e as interações na vida real. No cinema, o realizador tira partido desses espaços para definir os personagens. A escolha do espaço de vida, local de trabalho ou local favorito de um personagem pode revelar sutilmente aspetos de sua personalidade, valores e desejos.

 

 

Case Ennis

 

A Casa Ennis, por exemplo, projetada por Frank Lloyd Wright é usada como cenário em vários filmes e séries – Twin Peaks, Rush Hour, The Game of Thrones, Blade Runner, entre outros. A Casa Ennis possui uma imagem forte e absolutamente distinta, mas com o recurso a várias técnicas do cinema os realizadores conseguem caracterizar o espaço dando-lhe ambientes e programas distintos.

Ennis House – Frank Lloyd Wright | Fonte: Love PropertyArquitetura e cinema

Blade Runner – apartamento Rick Deckard | Fonte: Love PropertyArquitetura e cinema

Game of Thrones – Meereen Palace | Fonte: Love Property

 

Bradbury Building

 

O mesmo acontece com o Bradbury Building, um dos edifícios mais filmados de Los Angeles. Projetado por George Wyman, o edifício é famoso pela sua impressionante estrutura interior, com uma grande claraboia e uma magnífica escadaria de ferro ornamentada, tendo assumido várias tipologias, desde hotel, a edifício de escritórios, a habitacional. Este edifício surge em filmes tais como (500) Days of Summer, The Artist, Lethal Weapen 4, Blade Runner, entre outros.

Bradbury BuildingGeorge Wyman | Fonte: Curbed & ExperienceFirst

Blade Runner – Apartamento Toymaker J.F. Sebastion | Fonte: The American Society of Cinematographers

Arquitetura e cinema

(500) Days of Summer | Fonte: SCEEN-IT

 

Juvet Landscape Hotel

 

Podemos ainda referir o Juvet Landscape Hotel desenhado pelo gabinete Jensen & Skodvin Arkitektkontor. Este edifício, situado na Noruega, surge no filme Ex Machina como a casa refúgio do bilionário da tecnologia Nathan, ditando a estética de todo o filme.

Juvet Landscape Hotel – Jensen & Skodvin Arkitektkontor | Fonte: MUBI

EX Machina – casa do Natthan | Fonte: Filmgrab

 

Arquitetura e narrativa

 

Outro tipo de abordagem da relação do cinema com a arquitetura é a do filme A Origem (2010) Inception de Christopher Nolan, um exemplo de como as montagens podem combinar magistralmente arquitetura e narrativa. O filme mergulha no mundo dos sonhos, com personagens navegando por múltiplas paisagens oníricas que se dobram e se cruzam. O uso de montagens permite transições perfeitas entre esses níveis de sonho, criando uma experiência fascinante para o público. A paisagem urbana visualmente deslumbrante de Paris dobrada sobre si mesma é uma montagem arquitetónica inesquecível, simbolizando a natureza maleável dos sonhos e do subconsciente.

Arquitetura e cinema

Inception – Paris | Fonte: Archdaily

 

Em conclusão, a interseção entre arquitetura e cinema é um campo fértil para a criatividade, permitindo a exploração de novos horizontes e a criação de mundos imaginários. O cinema usa a arquitetura como uma tela em branco para as suas histórias, enquanto os arquitetos encontram inspiração e referências cinematográficas para suas próprias criações. Essa simbiose entre duas formas de expressão artística contribui para a riqueza visual e emocional de filmes e espaços arquitetónicos, deixando uma impressão duradoura no público e na sociedade.
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